quinta-feira, maio 24, 2007

Time machine

Ele estava ali, bem na sua frente. Naquele café que vocês se beijaram pela primeira vez. Fazia muito frio. O ar gelado contrastava com a luz do sol brilhante e o céu azul turquesa. Coincidentemente, você estava usando aquele casaco longo de couro e lã que ele adorava. Você estava linda e confiante. Será que ele a estava seguindo? Parecia que sim. Ele estava batendo a perna no chão, como fazia quando estava ansioso. Você estava doida para ir atrás dele, mas queria ele no chão só mais um pouquinho. Só para que ele implorasse. A oportunidade era agora ou nunca. Você deu um sorriso maroto, levantou-se, empinou o nariz, fez cara de má, colocou seus óculos escuros chiquérrimos e começou a caminhar como se estivesse em uma passarela. Deslumbrante. Estava decidida. Esbarrou com um pouco de força, mas graciosamente, no braço dele. Soltou um suspiro de dor e surpresa, abriu a boca para um sonoro "ai", virou o rosto de lado, jogou os longos cabelos negros e cintilantes para trás, colocou a mão nos óculos e os inclinou para cima, de modo que seus olhos perfeitamente contornados de preto ficassem minimamente visíveis. "É você?", disse. Recolocou os óculos. "E eu achando que hoje o dia estava ótimo... acabou de ficar péssimo.", continuou. "Que cara é essa, de cachorro perdido? Está sozinho?", perguntou com desprezo, embora estivesse com vontade de agarrá-lo. "Na verdade, não.", ele falou. "Agora estou com você...", ele completou. Antes que o sujeito pudesse abrir a boca para completar a frase, você emendou: "Ah, mas a sua sorte vai durar pouco. Eu já não lhe falei que não o quero de volta? Você já não está cansado de ficar correndo atrás de mim? Já não lhe disse que não aceito suas desculpas furadas? Que você não significa nada para mim?". Aquelas palavras saíram do fundo de seu coração ferido. Disse tudo aquilo com um ar superior, enquanto disfarçava o misto devastador de ódio e paixão que invadiam seu corpo. Ele abriu os olhos, abaixou a cabeça, deu um sorrisinho de lado e calmamente repetiu: "Agora estou com você, porque você fez questão de levantar a bunda daquela cadeira ali (apontou com o dedo) e vir aqui esbarrar, de propósito, em mim. Mas, na verdade, eu estava esperando a Gigi...". Ele olhou atrás de suas costas e você se virou. A Gigi era uma loira esguia, com um sorriso impecável e toda simpática (daquelas que fazem você ficar com raiva). "Gigi, venha cá!", ele falou. "Gigi, essa aqui é uma conhecida... hmmm, me desculpe... como é mesmo o seu nome??". Você queria matá-lo. Você não conseguia esconder sua respiração afoita. Sua ira. Sua vontade de gritar e sair correndo. Sua vontade de grudar nos fartos cabelos loiros da Gigi e arrancá-los todos. Você cerrou os lábios, engoliu o orgulho, virou as costas e saiu. Quase em disparada. Totalmente humilhada. Se arrependimento matasse, você já estaria em estado de putrefação. Foi quando seu salto ficou preso em um bueiro e você caiu. Caiu direto em seu próprio corpo, deitada no sofá. Aliviada, decidiu que da próxima vez que o visse, iria fechar os olhos, respirar fundo e contar até dez. Estava tudo claro agora: cabeça fria seria a melhor solução até que alguma mulher desesperada finalmente inventasse uma máquina do tempo.

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